sábado, outubro 29

Veja que surpresa

Eu não sei como dizer. Acho que desaprendi a passar os meus sentimentos a personagens fictícios, a gurias de mentira, a caras que eu invento. Eu não sei mais como dizer as coisas que eu queria sem assumir a sentença com um enorme "eu", ou sem conjugar o verbo na primeira pessoa.

Veja que surpresa.

Quem sabe as palavras tenham fugido do meu alcance só pra me obrigar a reconhecer em mim tudo que eu descrevo nos outros. Desaprendi a fixar a máscara; esqueci da conjugação dos verbos. Fiz de conta não tenho medo e abri a porta para o lado de dentro.



Disse que abri a porta para o lado de dentro. Agora você vê... que surpresa.

segunda-feira, outubro 24

Tá frio, tá quente

A gente vai continuar passando a vida inteira à procura de alguma coisa que não deveria estar lá. Aí, como faz? A gente vai continuar olhando para os dois lados antes de atravessar a rua, mas não vai aprender a olhar para trás e correr de volta para dizer que  sente muito, que sente saudades - que sente alguma coisa. A gente vai fingir que não se importa e vai seguir andando, sempre em frente. 

Só que não há problema em andar para trás, de vez em quando.

A gente precisa assumir nossos joelhos ralados, admitir nossos tropeços. Vamos andar para todos os lados. A gente pode até continuar procurando alguma coisa que não está na nossa vida, mas pelo menos essa busca vai nos mover em alguma direção. E a gente precisa aprender que não importa a direção; importa é seguir caminhando. 

E chegar onde quer que seja. 

sexta-feira, outubro 21

So, tell me why

O porquê disso tudo. Dessa vontade de nada, de ser sem ser de verdade. Dessa coisa que fica parada dentro do peito da gente, pesando o coração e amassando qualquer tentativa de respirar fundo. Alguém me explica como se faz para transformar todo esse peso em alívio, em felicidade despreocupada. Em algo que valha.

Eu perdi as contas dos dias que passaram nesse sem fim sem cor. Eu perdi os dias que passaram contando as aquarelas em branco que eu tinha, e tentando preenchê-las de alguma forma - se havia uma forma. Alguém me diz por que esse vazio nunca enche; por que essas coisas que a gente não sabe nem dizer o que são insistem em se acomodar naquele canto mais frágil. Eu perdi a conta das cores que inventei para usar, só que o pigmento nunca durou tempo o bastante.

Essa vontade de mentira, que faz viver com o corpo oco, move minhas pernas e exibe um sorriso desbotado, que ainda convence muita gente. Mas me dói quando alguns de vocês não conseguem enxergar que as estruturas estão desmoronando, entrando em colapso, e esperam pelo meu pedido de socorro. Vocês sabem que eu não vou pedir. Mas eu aceito um abraço.


quinta-feira, outubro 20

Veja só

Alguém me disse que você estava muito bonito naquela roupa. Que estava desfilando um corpo bastante bem moldado e que tinha consigo um semblante tranquilo. Disseram que você parecia até feliz.

Só que eles não sabiam onde você esteve na noite passada. E achavam que me faziam mal.
Veja só.


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segunda-feira, outubro 17

Desafio

Defina vontade.





Agora me diz por que não.

quinta-feira, outubro 13

De fora

Eu não estou disposta
a escolher um lado
Nem tomar partido,
ou juízo.
Ou ainda vergonha na cara.
Não estou disposta a oferecer a outra face
a um outro tapa, um outro corte.

Eu vou fazer de conta que não sei
das coisas
que se passam por detrás dos rostos
[que eu visto]
dos gostos
[que eu tenho]
e dos gestos, e trejeitos,
suspeitos. Culpados.

Eu não estou disposta a comprar a minha briga.

A minha vida.

E essa merda toda.


.

terça-feira, outubro 11

Vai e vem

Agora você vai se deitar ao meu lado e eu vou fingir que acreditei na sua história. A noite será longa e cansativa, mas, no fim das contas, ambos estamos sendo usados. Que seja. Vamos combinar, então, que você também pode fazer de conta que não conhece os meus fantasmas, e eu prometo que da minha boca não sairá uma palavra maldosa. Nem uma coisinha que possa te deixar desconfortável. Mas não tente fingir inocência, que esse jogo já acabou faz tempo.

Tudo às claras. Temos um acordo: você me ajuda a relaxar enquanto eu fico falando sobre futilidades, e eu ajudo a sua consciência a descarregar o peso. É uma via de mão dupla, querido.

Sempre foi.

domingo, outubro 9

Nota II

Eu poderia ter te abraçado com mais força que da última vez, e a gente teria conversado sobre todas as coisas aleatórias que vinham acontecendo. Ou talvez a gente só conversasse e quem sabe dividisse uma cerveja - e ainda seria uma boa lembrança, mesmo que a gente prefira outra bebida. Eu nunca vi problemas nas amizades que têm cores. O problema é quando a tinta começa a descascar, e ela volta a ficar em preto e branco.


Eu tento evitar a estranheza da situação, mas não depende só de mim. Que culpa eu tenho?

sexta-feira, outubro 7

Importa o oposto


Eu posso ser assim mesmo.
sentir aberto o peito, coração exposto, tapa no rosto. 
Eu posso viver desse jeito.
Sentido inverso, oposto
e esquecer das placas que orientam sobre a direção
correta.


Não sigo, incrédula
sou torta e assumo que posso ser assim mesmo
coração aberto, ferido
de corpo cansado.
Sigo mudando de esconderijo;
adaptando-me ao contrário. Arrisco.


Porque viver desse jeito eu consigo:
não posso sair é do inverso,
ou me perco
e deixo de ser, não existo.
Sou oposto. Exposta. 
Em risco




[Inconstante.]

quarta-feira, outubro 5

E então vou poder fazer as coisas que eu queria [fazer contigo]

Estou indo para qualquer lugar, com a intenção de encontrar de novo o tempo bom que passou por nós. Queria ver aquelas tardes douradas pelo sol do outono, e sentir as coisas que eu sentia na época. As coisas que não tinham nada a ver com ninguém em especial, mas comigo mesma; com o lado de dentro desse coração torto que nunca me largou. Não me leva a mal: tu sabes da importância que tens. Mas o meu problema é comigo, e já faz tanto tempo. Eu vou voltar pro ponto onde as coisas começaram a desabar e tentar arrumar a estrutura antes que ela se desfaça. Antes que eu acabe desfeita, mais uma vez.


Mas eu prometo que volto. E inteira.